Sou filha de pais separados e o Bruno também. Tenho um irmão menor que vive com a minha mãe e passa um fim-de-semana no meu pai de 15 em 15 dias. Os Natais e as passagens de ano são alternados. O mesmo para a Páscoa e aniversários. E mais 1001 coisas, tudo escrito num acordo que nem sempre é lido e/ou cumprido.
A Matilde tem os 2 avôs e as 2 avós, um em cada lado. E se alternarmos as festas para podermos estar um ano em casa de cada um, só poderemos estar com cada um deles de 4 em 4 anos. E se vou ao Porto, tenho de organizar muito bem o meu tempo, estabelecer prioridades e tentar agradar a gregos e troianos. E quando há zangas e problemas, um liga de um lado, outro liga do outro. Porque ela é que tem culpa, porque ele é que fez assim e assado. E tenho que tentar ver o lado da razão o que implica que um deles vai ficar chateado. Porque quando acabei o curso a minha mãe não foi almoçar comigo para não se verem. Porque quando a Matilde nasceu, ainda eu estava na maternidade e queriam que eu decidisse quem iria ter em casa para me visitar. Porque não se queriam cruzar. Como se eu tivesse alguma coisa a ver com isso, ou paciência para resolver o assunto. Que se entendam e não me chateiem, é o que me apetece dizer. E pergunto-me como será em festas futuras. Os "adultos" são piores que as crianças.
Isto é tudo uma grande trapalhada. E não me venham dizer que as crianças entendem, que para eles é tudo normal, que estão mais que habituados. Se a mim me faz confusão, se me custam certas situações, se sofro em certos momentos... numa criança tudo isto deve ser a dobrar ou triplicar. E sabe Deus as vezes que eu já chorei por saber que o meu irmão não teve nem vai ter metade do que eu tive. E que não presenciou os momentos de felicidade que eu presenciei. E que nunca vai olhar para os dois juntos e felizes com admiração e acreditar (como eu acreditava) que os pais se amam a sério e que são os mais felizes do mundo e arredores.
Aquilo que eu mais desejo para a minha vida não tem a ver com realização profissional ou com o ter uma grande moradia ao pé da praia, com piscina e uns 10 empregados. Não tem a ver com roupas caras, sapatos xpto e maquilhagem. Nem tampouco com viagens pelo mundo fora, sem ter nada que me prenda a casa. O sonho que eu mais gostava de realizar, era o velho
cliché: os dois velhinhos (ainda felizes, ainda apaixonados), lado a lado, a ver o pôr-do-sol com um rancho de filhos, netos e bisnetos. O que eu menos quero é que a Matilde cresça com o coração dividido, e viva como se fosse uma bolinha de ping-pong. Não sei se é o que vai acontecer e sei que é o que quase todos sonham e muito poucos realizam. Mas acredito que pode ser possível, se se quiser com muita, muita força.
